A inteligência artificial exige uma reflexão crítica: seu uso pode ser positivo ou negativo. O essencial é adotá-la com ética, responsabilidade e bom senso, especialmente na produção científica acadêmica.
Ela, a IA, veio para ficar. E aí? Essa pergunta não é apenas um trocadilho, exige reflexão. Muitas são as empresas e pessoas que já estão utilizando e operando com a inteligência artificial, inclusive já estão se tornando dependentes dela. Isso é bom ou ruim? É aceitável ou inaceitável? É oportuno ou inoportuno? É ético ou não ético? Não podemos tratar esse fenômeno com dualismo. Cabe aqui a dualidade, ora pode ser positiva e ora pode ser negativa, ou até as duas facetas para a mesma situação. Na verdade, precisamos saber lidar com ela de forma segura e responsável, usufruindo dos aspectos positivos, sempre nos atentando para a ética e o bom senso, maximizando seus benefícios e mitigando seus riscos.
Como sabemos, a aplicabilidade da Inteligência Artificial (IA) é muito ampla. Vamos focar na produção científica acadêmica, refletindo sobre os questionamentos que provocamos acima.
A ascensão da IA tem provocado uma revolução em diversas áreas, e a produção científica acadêmica não é exceção. Ferramentas conhecidas como LLMs – Large Language Models (Modelos de Linguagem Grandes, ou seja, sistemas de inteligência artificial) oferecem um potencial inegável para auxiliar pesquisadores em tarefas como revisão bibliográfica, organização de ideias, estruturação do texto e até mesmo na redação preliminar das seções, seja em artigo de periódico, em monografia, em dissertação ou em tese. No entanto, o entusiasmo com as possibilidades que a IA oferece pode fazer com que os limites permissíveis, segundo a ética, sejam ultrapassados.
Portanto, esse uso deve ser acompanhado e freado. A IA pode ser um auxílio na pesquisa, na geração de ideias, e até, em parte, na escrita de textos. No entanto, é crucial garantir que o trabalho final seja original e que a IA seja utilizada como uma ferramenta de apoio, e não como um substituto para a sua própria reflexão e análise. A seguir, vamos abordar as premissas que devem ser consideradas no trabalho científico acadêmico.
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A principal preocupação reside na autoria e na originalidade. Um texto científico acadêmico é, por definição, o resultado de pesquisa, análise crítica e argumentação original do autor. Quando a IA é utilizada para gerar seções substanciais ou até mesmo a totalidade de um texto, a linha entre a assistência e a substituição da autoria torna-se tênue. Isso levanta questões sérias sobre a integridade acadêmica e a capacidade do pesquisador em demonstrar um domínio genuíno do tema, algo essencial para essa trajetória.
Além disso, a IA, por mais sofisticada que seja, ainda carece de compreensão contextual, de capacidade de inferência humana e de nuance crítica, que são intrínsecas à pesquisa de alto nível. Ela pode sintetizar informações existentes, mas não é capaz de gerar insights verdadeiramente inovadores, formular hipóteses originais baseadas em observações empíricas complexas ou conduzir análises qualitativas aprofundadas com a mesma perspicácia de um pesquisador experiente. A criatividade, o pensamento crítico e a capacidade de fazer conexões inesperadas e lógicas dentro do contexto da pesquisa permanecem domínios fundamentalmente humanos.
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Outro ponto crucial é a responsabilidade. Quem assume a responsabilidade por erros factuais, interpretações equivocadas ou mesmo plágio, até então não percebido, quando um texto é gerado por IA? A ética acadêmica exige que o autor seja plenamente responsável pelo conteúdo apresentado. A IA não pode ser coautora de trabalhos científicos, pois não assume responsabilidade intelectual, somente o autor responde pelos seus achados. Delegar essa responsabilidade a uma máquina compromete os pilares de confiança e de prestação de contas junto à comunidade científica.
Para garantir a integridade e a qualidade da produção acadêmica com o uso da IA, é fundamental estabelecer diretrizes claras e, como já dissemos antes, seu uso deve ser visto como uma ferramenta de apoio, e não de substituição. Mas quais seriam as diretrizes para o uso consciente da IA na academia?
A inteligência artificial oferece um potencial transformador para os pesquisadores, mas sua adoção eficaz e responsável exige mais do que apenas entusiasmo. Para colher seus benefícios e mitigar os riscos, é imprescindível o estabelecimento e a adesão de diretrizes claras. Seguem, então, algumas dessas diretrizes:
O uso de ferramentas de IA deve ser explicitamente declarado e detalhado, especialmente quando se trata de auxílio na redação ou na análise de dados, portanto, é fundamental descrever claramente como, quando e para quê a IA foi utilizada (por exemplo, geração de texto, análise de dados, tradução), citando as ferramentas que foram utilizadas (ChatGPT, Gemini, Copilot, Deepseek etc.), com data e versão, se possível, na metodologia ou em nota de rodapé.
Verificar se a IA gerou conteúdos que reproduzem trechos já existentes, pois isso pode configurar plágio não intencional. Como ela é generativa e utiliza modelos de aprendizado profundo, ou seja, funciona a partir do treino, das interações, dos materiais já disponíveis, é possível que ocorra plágio.
Todo conteúdo gerado por inteligência artificial deve ser cuidadosamente revisado, verificado e editado por um humano. O que a inteligência artificial gera deve ser considerado como rascunho, porque a forma final e a validação do conteúdo devem ser sempre responsabilidades do autor.
A IA pode auxiliar na organização, mas a formulação da tese, a análise dos dados e a discussão crítica devem ser intrinsecamente originais e provenientes do raciocínio do autor.
É essencial confirmar dados e citações com fontes primárias ou confiáveis e evitar confiar cegamente em referências bibliográficas geradas por IA, porque pode haver informações inventadas (alucinações) ou imprecisas.
Tendo em vista tudo isso e o rigor acadêmico que requerem as publicações científicas, é fundamental que os estudantes e pesquisadores continuem a desenvolver suas próprias habilidades de escrita, pensamento crítico e pesquisa, sem a dependência exclusiva da IA. A inteligência artificial deve complementar, e não substituir, a participação do autor, esse deve manter o domínio do conteúdo e do método. Outro ponto ainda a ser observado sobre o seu uso é a questão da atualização constante em relação às políticas de periódicos e aos eventos científicos sobre o assunto, as ferramentas utilizadas e os debates éticos e regulatórios.
Como vemos, o desafio reside em integrar a IA de forma a potencializar a capacidade humana, sem jamais comprometer a essência e o rigor do fazer científico. Mas como utilizá-la dessa forma? Analisando cada seção do texto científico, podemos ver onde há margem para uso da IA e como fazê-lo com cautela e parcimônia.
Em sua maioria, os textos científicos, sem entrar no mérito dos elementos pré e pós-textuais, são divididos nas seguintes seções:
Agora, vamos sugerir as possibilidades de uso da IA em cada seção de forma responsável e ética:
Em relação a todo o texto, a IA pode fazer uma revisão linguística e de formatação, aprimorando a gramática e verificando a clareza, a coesão e o estilo científico da escrita. E, ao final, ainda pode auxiliar na formatação de referências em diferentes estilos (APA, Vancouver, ABNT), desde que submetidas a uma revisão.
A conclusão decorrente dessa análise, apesar de óbvia diante de tudo que o foi apresentado, é que a inteligência artificial deve ser utilizada de forma estratégica pelos pesquisadores, otimizando significativamente o processo de elaboração dos textos científicos acadêmicos, liberando tempo para que foquem na análise crítica e na originalidade de suas contribuições, e respeitando a ética e o rigor que exige a ciência.
Portanto, a integridade acadêmica deve permanecer como princípio orientador, evitando o plágio, a manipulação indevida de dados e a atribuição errônea de autoria. Ao adotar boas práticas e respeitar os normativos das instituições e da comunidade científica, pesquisadores garantem que a IA atue como uma aliada na construção do saber, e não como um atalho que compromete a credibilidade da ciência.
E você já está utilizando a IA nas suas atividades diárias? Já se atentou para essas questões em relação aos textos científicos? Comente abaixo e compartilhe!