A sua IES aplica tecnologias de personalização do ensino que promovem e incentivam a autonomia do estudante?
- Como usar a tecnologia para a personalização do ensino?
1.1. A burocracia
1.2. O currículo
1.3. Materiais pedagógicos
1.4. Avaliações - E na prática?
Não é incomum, nos corredores das instituições de ensino, ouvir reclamações pela falta de engajamento dos alunos nas aulas, sejam elas presenciais ou remotas. Por mais que o conceito de metodologias ativas esteja quase que banalizado no mundo educacional, percebemos que a prática ainda não é suficiente para garantir o sucesso do aluno. Para compreendermos melhor esse problema, não basta apenas nos determos na análise de conceitos educacionais e pedagógicos, devemos também analisar este fenômeno de uma forma sociológica e histórica para compreendermos onde estamos falhando.
Neste sentido, partimos da premissa que as tecnologias fazem parte das nossas vidas, principalmente dos jovens. Embora haja uma certa falta de letramento digital para muitos, é inegável que a tecnologia fascina e engaja. E é isso que devemos olhar: o impacto tecnológico na contemporaneidade como um todo.
No aspecto educacional, se voltamos aos tempos da academia Akadémia não veríamos nada do que vemos hoje. Veríamos filósofos que fundamentaram as ciências atuais discutindo em um jardim livremente. Se voltamos para o tempo do início das universidades, já veríamos as salas de aulas, mas sem as famosas chamadas, provas ou grades curriculares.
Foi neste modelo, que perdurou por séculos, que floresceu as mais incríveis mentes da humanidade. Ou você acredita que Freud ou Einstein estavam preocupados com a lista de presença ou em responder à chamada? Então, onde foi que erramos? Erramos por não acompanhar o que o Zeitgeist nos diz. Esse "espírito do tempo", nos mostra que os jovens querem liberdade. Liberdade de escolha, de pensamento, de profissão e muitas outras coisas. Podemos dizer que o Zeitgeist quer a liberdade da mente. Isso não seria diferente na educação. A educação deve ser libertadora. Não digo libertadora no sentido freiriano, mas digo no sentido de escolha e de personalização.
Por outro lado, o ensino tradicional está fora do tempo até mesmo no uso dos termos totalmente contrários ao processo de libertação. Termos como grade curricular, disciplina, encerramento do semestre, fechamento dos diários, etc. Ainda pensamos em salas fechadas, provas, chamada e inúmeros relatórios sem sentido para preencher (para alunos e professores).
Enquanto docentes, quanto tempo precioso não perdemos em uma chamada, em um lançamento de notas e faltas ou no preenchimento dos planos de ensino? Enquanto alunos, quanto tempo não se perde com as atividades burocráticas da instituição. Isso tudo faz com que a instituição muitas vezes não seja atrativa e o pior, não promova aquilo que ela se propõe: ensinar algo relevante.
Uma vez que queremos formar cidadãos conscientes e excelentes profissionais, devemos sempre partir da premissa dos tempos atuais: Liberdade e tecnologia. Além disso, o ensino massivo igual para todos também fere a liberdade de escolha dos alunos e se sobressai os desejos de um grupo de dirigentes muitas vezes desconectados da realidade dos alunos. Será que cada aluno não é capaz de saber o que quer? Será que não poderíamos trabalhar nas habilidades potenciais individualmente? Sim, nós podemos! E a tecnologia está aqui para isso.
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Como usar a tecnologia para a personalização do ensino?
Já que não temos muitos jardins para aprender livremente e temos diversas regras governamentais sobre educação, é a tecnologia que pode nos salvar e nos tirar do aprisionamento educacional fabril que está presente na atualidade. Obviamente tecnologia sem metodologia de uso não servirá para nada, mas esse é um tema para uma próxima discussão. A ideia deste artigo é apresentar as possibilidades para responder às necessidades contemporâneas da nossa sociedade em relação a educação
A burocracia
Vamos iniciar pela parte burocrática. É claro que por questões financeiras e estratégicas as instituições devem ter processos de controle. Saber sobre a evasão dos alunos, frequência nas aulas e desempenho acadêmico é algo muito importante para a saúde da organização. Porém, atualmente já existem diversas soluções para controle de presença por meio de QR-Codes, catracas inteligentes e até mesmo dispositivos RFID (Radio Frequency Identification).
Diante destas tecnologias, já rompemos com o primeiro aprisionamento das instituições e abrimos espaço para o tempo e para liberdade. Afinal, um aluno que está na instituição, mas não está em sala de aula, será que merece levar uma falta? Quantos alunos não faltam às aulas para fazer trabalho na biblioteca? Tenho plena convicção que são muitos. Além disso, presença por RFID indicará até os ambientes que esse aluno frequentou. Porém, se alguém ainda acredita que presença é estar em sala de aula, esse pode se decepcionar ao encontrar as inúmeras conversas trocadas via WhatsApp durante sua aula.
Outro item interessante são os diários e relatórios. Notas dependem do sistema de avaliação, mas se o sistema usa tecnologia, já não precisamos mais de diários. Os diários deveriam ser substituídos por dashboards. Faz muito mais sentido um B.I. de classe do que um diário cheio de números aleatórios. Com um bom LMS isso fica fácil de ser resolvido, mesmo no ensino presencial. Devemos também lembrar que as tecnologias que eram aplicadas apenas ao EAD, devem ser levadas ao presencial, pois partimos para um futuro onde não haverá mais essa distinção de curso. Então, ter um LMS para o ensino presencial é fundamental.
Esses pontos são importantes também, pois estamos contratando jovens professores. E do mesmo modo, jovens não possuem paciência para burocracia. A tecnologia deve ajudar alunos e docentes a romperem a burocracia, mas preservar os dados vitais para a instituição.
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O currículo
Na questão curricular, há várias possibilidades que a tecnologia pode promover. Como por exemplo, sistemas de currículos flexíveis e inteligentes, proporcionando aos alunos a escolha dos conteúdos que mais fazem sentido a eles.
As trilhas de aprendizagem na educação à distância são uma realidade pouco explorada. No ensino presencial, muitas vezes o entrave econômico busca lotar as salas e com isso flexibilizar pouco o currículo, oferecendo muitas disciplinas comuns. Isso é plenamente corrigido com um pouco de inteligência artificial ou de algoritmos.
A grande questão é que oferecemos o que queremos, mas nunca perguntamos aos alunos o que eles querem. Será que se deixássemos os alunos pedirem por disciplinas, também não conseguiríamos uma eficiência econômica com garantia de liberdade dos nossos alunos em relação aos desejos puramente institucionais? Vamos além disso, será que o modelo de disciplina ainda faz sentido? Será que precisamos de sala de aulas com matriculados e registrados para aprender?
As trilhas flexíveis de conteúdo assíncrono, orientações e projetos podem construir um conhecimento relevante, sem a necessidade de se fechar nas estruturas acadêmicas. E a tecnologia é capaz de articular essa questão e ainda garantir uma eficiência econômica.
Materiais pedagógicos
Os recursos educacionais ligados aos materiais instrucionais e formativos talvez sejam os mais vastos no mercado. Porém, mesmo diante da vastidão deles é necessário perguntar o que nossos alunos querem.
Em uma pesquisa realizada em 2018 com 306 alunos do ensino superior presencial¹, constatamos que 54,3% dos entrevistados usavam a internet para complementar os estudos. 35% assistem vídeos no Youtube para aprender e 24% deles frequentavam a biblioteca. Percebemos a predominância das tecnologias na vida do aluno face ao frequentar a biblioteca física. Porém, o mais interessante é que 47% dos alunos informaram que ler livros ou capítulos de livros é muito importante para o aprendizado, mesmo não frequentando a biblioteca física.
Com esses dados já temos diversas soluções de tecnologia, como por exemplo, vídeo aulas complementares por curadoria ou autoral em resposta ao uso do YouTube, aplicativos de aprendizagem para o uso da internet em pesquisas e a biblioteca virtual como resposta a necessidade de leitura sem a necessidade de estar presente na estrutura física. Percebemos que os recursos são os mais variáveis, de fácil acesso e implementação.
Talvez, a grande questão seja como utilizá-los corretamente e garantindo a personalização da necessidade de cada aluno. Alguns preferem vídeos, outros áudios, outros livros. Já temos tecnologia suficiente para promover essa liberdade de escolha e personalização. É um trabalho inicial gigante para estruturação, mas os resultados podem ser promissores para os alunos que serão impactados.
Avaliações
Avaliações não deveriam ser como são. Elas são padronizadas, não garantem aprendizado e não engajam os alunos. O modelo de ranqueamento por nota promove muitas vezes as fraudes por cola ou na modalidade remota promove a possibilidade de um terceiro fazer as atividades (algo que já pode ser controlado por meio da tecnologia de proctoring). Avaliação por gamificação são preferidas por alunos e se vinculada aos objetivos de aprendizagem são muito mais eficazes e personalizados.
Personalizar o ensino é verificar competências atingidas, lembrando que cada um tem sua própria tendência de competência. O recorte em notas 0, 5 ou 10, não informa o que o aluno sabe fazer. O mapeamento das competências por projetos, debates, apresentações e ideias é libertador, pois demonstra realmente as habilidades adquiridas no processo de ensino-aprendizagem e com certeza é muito mais interessante.
Atualmente, há várias ferramentas capazes de criar um sistema de avaliação robusto, inteligente e ainda fornecer um Radar Chart ao professor. É esse Radar Chart que deve ser avaliado. E está tudo bem se os alunos alcançarem níveis de proficiência diferentes, o importante é que ele se destaque nas competências que ele deseja ter. É isso que nosso aluno quer, saber suas próprias habilidades e potencialidades.
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E na prática?
Sei que na escrita de um artigo, a ideação é muito mais fácil que a realização. As tecnologias citadas envolvem custos, por muitas vezes, elevados. Porém, é importante estar sempre atento às possibilidades tecnológicas, mesmo que distantes para aplicação.
Sabemos que a economia de escala permite a redução de custos. Tempos atrás, ter um projetor multimídia na instituição era algo inovador e caro, atualmente, isso é plenamente acessível e nada inovador. E agora, a questão não é ter o projetor, mas sim saber usá-lo.
Do mesmo modo, embora nem todas as instituições estejam preparadas financeiramente para implementar as tecnologias apresentadas, elas devem estar preparadas para a metodologia futura ao uso destes dispositivos, pois o amadurecer o fator humano leva muito mais tempo que amadurecer a própria tecnologia. E quando a economia de escala derrubar os preços, estaremos prontos para fazer uso de todo potencial dela. Por outro lado, as instituições que podem aplicá-las e não aplicam, simplesmente estão perdendo um excelente diferencial competitivo.
Por fim, o que nossos alunos querem é aprender, mas aprender de outro modo. Não é mais como nós aprendemos. Eles querem autonomia, desafios, colaboração, relacionamento e humanidade. Se nós não estivermos atentos a isso, haverá sempre o conflito entre aluno e professor e isso, é a pior coisa que pode acontecer. Espero que a tecnologia nos una e potencialize o nosso dever educacional.
Referências
1. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/40227
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